NEM ALGOZES, NEM VÍTIMAS... Policiais Militares: os defensores da ordem pública!

RESUMO
O incidente ocorrido num dos Quartéis do 46° BPM/M, em 05 de abril de 2023, expôs um paradigma imagético que, na subcultura, personifica as 2 supostas estereotipias do Policial Militar. Numa das vertentes, o algoz (predador), que resolve as demandas Institucionais baseados nos conceitos de Autoridade, papel esse rotulado aos Oficiais. No outro pólo, encontramos as Praças, imbuídas no papel de vítimas (presas), já que são responsáveis pelo exato cumprimento de todas as ordens emanadas, sujeitos de fiscalização e alvo do poder disciplinar. Tal debate, amplificado por demandas correlacionadas com plano de carreira e valorização profissional, camuflam o verdadeiro papel Constitucional do Policial Militar Bandeirante, qual seja, de personificar o Agente Público responsáveis por preservar a Ordem Pública em seus 3 espectros vitais: segurança, salubridade e tranquilidade. A mitificação dos 2 extremos na construção do significado deste Militar do Estado interfere, segundo conceito da Semiótica, na identificação do próprio Signo profissional, afastando-se do Ethos Guerreiro e conduzindo-a a uma perigosa diminuição de candidatos interessados em se comprometer num juramento com o sacrifício da própria vida. 
Palavras-chave: Policial Militar. Autoridade. Vítima. Ordem Pública

ABSTRACT
The incident that took place in one of the Barracks of the 46th BPM/M, on April 5, 2023, exposed an image paradigm that, in the subculture, personifies the 2 stereotypes of the Military Police. In one of the aspects, the executioner (predator), who resolves Institutional demands based on the concepts of Authority, a role assigned to Officials. At the other pole, we find the squares, imbued with the role of victims (prisoners), since they are responsible for the exact fulfillment of all orders issued, subjects of supervision and target of disciplinary power. Such a debate, amplified by demands correlated with a career plan and professional enhancement, camouflage the true Constitutional role of the Bandeirante Military Police, that is, to personify the Public Agent responsible for preserving Public Order in its 3 vital spectrums: security, health and tranquility. The mythification of the 2 extremes in the construction of the meaning of this State Military interferes, according to the concept of Semiotics, in the identification of the professional Sign itself, moving away from the “Ethos of the Warrior” and leading it to the a dangerous decrease in candidates interested in committing themselves to an oath at the sacrifice of their own lives
Keywords: Military police. Authority. Victim. Public order.

1. TRAGÉDIAS E REFLEXÕES: O CASO DO 46° BPM/M
Na tarde de 05 de abril de 2023, a sociedade paulista foi surpreendida com uma triste notícia. Um Capitão da Polícia Militar do Estado de São Paulo (Cap PM) havia “trocado tiros” com um Sargento no interior de um quartel do 46° Batalhão de Polícia Militar Metropolitano (BPM/M), localizado na zona sul da Capital. Instantaneamente, episódio ganhou ampla divulgação repercussão midiática. Exemplificando tal assertiva, segue imagem de reportagem em página eletrônica de veículo de mídia do Estado do Mato Grosso sobre notícia do fato, em menos de 8 horas do ocorrido:

Ilustração 1: Reportagem sobre incidente envolvendo Cap e Sgt PM.
Fonte: Página 1 MT .

O consumo voraz de tragédias, efetivamente, se eleva a verdadeiro paradigma na subcultura  desta Instituição. O imaginário popular, curioso por obter dados, informações e opiniões sobre um singular e abjeto casuístico retroalimenta vorazmente o emparelhado e aparelhado maquinário midiático. Após 12 horas do episódio, 59 veículos de imprensa já haviam divulgado o fato, revelando inclusive hipóteses coligadas à necessária apuração, a ser realizada pela Caserna, já que se trata de crime militar  como, por exemplo, o homicídio :

Ilustração 2: Repercussão sobre incidente envolvendo Cap e Sgt PM
Fonte: Google Notícias

A comoção social gerada se constitui num crescente fenômeno quando fatos similares ocorrem envolvendo Policiais Militares. Ocorrências anteriores justificam o precoce apetite jornalístico por informar, apurar e conjecturar causas que explicam potenciais justificativos que, inexoravelmente, encontram motivo finalístico nos princípios deontológicos  e, também, na própria formação dos integrantes desta Instituição. O Decreto nº 54.911, de 14 de outubro de 2009 de São Paulo, que regulamenta a Lei Complementar nº 1.036, de 11 de janeiro de 2008, fomenta e estimula a importância da pesquisa científica na produção de competência do Policial Militar, desde sua formação .
Desconstruindo o estudo de caso que originou essas reflexões, encontramos a personificação de Policiais Militares estereótipos intensamente polarizados. Num extremo, o Policial Militar como vítima da sociedade, seja por suas condições de trabalho (jornada laboral intensa) ou, até mesmo, pela “opressão autoritária” de seus superiores (o Sgt em relação ao Cap). Diametralmente em outro espectro, temos o Militar do Estado como algoz, ou seja, protagonista em violência e abuso de poder, implicando sua força disciplinar contra a sociedade e, internamente, contra seus subordinados (Cap em relação ao Sgt).
Esse artigo, utilizando a análise exploratória , a semiótica  e a análise de discurso ; discorrerá sobre os 2 estereótipos rotulados e difundidos acerca do Policial Militar na sociedade. Tais polos representam, realmente e necessariamente, o significado da Polícia Militar e de seus integrantes em relação aos serviços que prestam ao povo paulista? A perspectiva extremada impacta no cumprimento da missão desta Instituição? Tais questões norteadoras permearam essa produção acadêmica que têm, como intuito finalístico, ofertar outra paralaxe acerca deste fenômeno.

2. ESTEREOTIPIA EXTREMADA: QUAL A REPRESENTAÇÃO DOS POLOS PARA O SIGNIFICADO DA “POLÍCIA MILITAR”?
A figura do Oficial da Polícia Militar do Estado de São Paulo personaliza a IMAGEM dos chefes e líderes Institucionais. A representação máxima deste “lócus” institucional está materializada na pintura num dos telhados da Academia de Polícia Militar do Barro Branco (APMBB), responsável pela formação destes:

Ilustração 3: Letreiro “Escola de Comandantes”, na APMBB.
Fonte: Os Piritubanos.

Embora comandar tenha um significado participativo , a diferença quantitativa entre os líderes (cerca de 5% do efetivo) e dos liderados (em torno de 95%), aliado ao já citado poder disciplinar compatível com a autoridade exercida, alimenta o paradigma imaginário, pautado no Signo da opressão. De um lado, os opressores (Oficiais), de outro os oprimidos (Praças).
As notícias que transmutam Oficiais e Praças em papéis sociais de oponentes, dentro de um teatro de operações corporativo, historicamente ilustram os cadernos policiais quando incidentes desta natureza e magnitude vêm à tona na rotina desta Instituição. O quadro abaixo exemplifica a maneira como a ocorrência do capítulo anterior foi retratada na mídia. Vejamos algumas lides jornalísticas relacionadas à ocorrência do capítulo anterior:

Ilustração 4: Análise de discursos sobre incidente envolvendo Cap e Sgt PM
Fonte: Os autores.

A análise de discurso relativa à lide das 5 notícias avaliam palavras eminentemente negativas no imaginário popular.  O cognato “morte” em versas flexões linguísticas aparecem em todas as manchetes. Com exceção do G1, os outros canais de comunicação deixam claro que “um Capitão matou um Sargento”, ou seja, pressupondo que o leitor entenda a diferença entre postos e patentes militares e que “um superior matou um subordinado”. As lides, também apresentam hipóteses (“áudio reclamando de exaustão”, “preciso ir embora daqui”), embora todas essas afirmações demandem um necessário e devido processo legal, via procedimento inquisitorial compatível com a situação .
Ainda considerando a análise de discurso, as lides também apresentam informações contraditórias acerca do mesmo fato. Enquanto a página eletrônica do UOL Notícias apresentava na manchete que o mesmo estava “reclamando da exaustão” em virtude da dificuldade de escalas impedirem seu retorno para o interior; o site G1 ilustrava que o Sargento “vivia o sonho de morar em São Paulo”. Ora, como um indivíduo vislumbrado por um local reclamaria de sua escala de serviço para voltar, com maior cotidianidade, a ter um convívio familiar?
Tal conjuntura efetivamente ilustra, com significância estatística, o ambiente e clima organizacional da PMESP? As polarizadas notícias contextualizam um ambiente que efetivamente corresponde à realidade interna da Instituição?
Novamente, à luz da análise de discurso, a lide apresenta a construção de um cenário retrospectivo trágico para a formação de opinião do significante que deseja atribuir um significado para a marca “Polícia Militar do Estado de São Paulo”, como “menor efetivo do século” e “especialistas apontam salário e imagens ruins”, contribuindo decisivamente para a prospecção intuitiva de um signo negativo para a Instituição.
Considerando a manutenção da população paulista em torno de 45 milhões de habitantes , natural o questionamento acerca de eventual impacto na produtividade policial-militar, decorrente da redução do efetivo, potencializado por esse suposto “conflito de algozes x vítimas” que popularizam o Imaginário midiático. Podemos afirmar, estatisticamente, que tais ilações são verossímeis?

3. POLICIAL MILITAR: O AGENTE FUNDAMENTAL PARA A PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA
Aparentemente vivenciando uma crise de redução de efetivo, explicada aprioristicamente pela “turnover” superior ao porcentual de ingresso na Instituição, a Força Pública paulista atingiu 80.137 Policiais Militares, contabilizando uma perda de 10 mil militares do Estado nos últimos 16 anos:

Ilustração 5: Reportagem na Folha de SP sobre efetivo na PMESP
Fonte: Folha de São Paulo.

Os casos extremados, que indicam necessariamente o Policial Militar como “algoz” ou “vítima” na sociedade, não correspondem com sua hercúlea atribuição manter a ordem pública em cada ente federativo do Brasil , especificamente no Estado de São Paulo .  
Apenas em Fevereiro de 2023, a PMESP recebeu 1.958.686 ligações, via 190, para atendimento de ocorrências, gerando 139.600 ocorrências, desde atendimentos sociais (41.207) até prisões de infratores em flagrante delito (7.031), recapturando foragidos pela justiça (2.937), localizando recuperando veículos (3.560). Foram apreendidos 13.728 kg de entorpecentes e 548 armas irregulares . Já o Corpo de Bombeiros, órgão integrante da PMESP, realizou 15.696 resgates.
Entretanto, esses robustos indicadores de desempenho não repercutem na produção midiática, tampouco no significado imposto pela imprensa ao referido signo. Utilizando-se as palavras-chave “Policia Militar do Estado de São Paulo” e “Indicadores”, foram produzidas 640 reportagens. As mais recentes não exploram os resultados de produtividade de fevereiro de 2023:

Ilustração 6: Repercussão sobre incidente envolvendo
Fonte: Google Notícias.

A semiótica de construção de signos apresentada pelos canais midiáticos deturpa a percepção dos significantes que consome as notícias policiais, sobretudo, para a formação da imagem da PMESP. Embora a reportagem com maior repercussão seja sobre a implantação das Câmeras Operacionais Portáteis (COP), a matéria apresenta indicadores de aumento de criminalidade, intuitivamente implicando à Instituição os fenômenos da prática delitiva que, sabidamente, possui amplos determinantes já consubstanciados cientificamente . 
Os ingredientes suspensos na solução de construção imagética da PMESP, inextricavelmente, conduzem para a polarização paradigmática de “algozes x vítimas”, catapultado pelo significado imposto pela mídia sobre o Signo PMESP.

4. À GUISA DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS: “ETHOS GUERREIRO” E O PERFL PROFISSIOGRÁFICO DO POLICIAL MILITAR
A PMESP, assim como qualquer Instituição, deve pautar a oferta de serviços públicos baseada, especificamente na competência de seus integrantes . Para tanto, deve investir na formação dos 3 atributos desta área , baseadas em suas atribuições constitucionais doravante citadas.
Com atividades funcionais claramente definidas, nota-se que as diretivas institucionais estão focadas na prestação de um serviço público de excelência para a população paulista , comunicando os indicadores citados no capítulo anterior com planos de ação destinados a promover a segurança pública da sociedade .
Para tanto, o resultado da exposição massiva, enviesada e estereotipada da imagem do Policial Militar atinge o imaginário do candidato e se torna perceptível na seleção de potenciais talentos para a PMESP. De um lado, homens e mulheres que cultuem em seu imaginário o “Ethos Guerreiro”  , se contrapondo com a atual geração de jovens, denominada de “millennials” , detentores de um código de conduta e de sociabilidade diverso das prioridades éticas exigidas na Instituição .
Assim, a Polícia Militar do Estado de São Paulo busca, desde o processo de seleção, a formação de um quadro de integrantes concursados que alinhe dedicação e compromisso, numa atividade essencial ao Estado que supera a característica de profissão, construindo-se efetivamente numa verdadeira missão , defendendo a sociedade e garantindo a Ordem Pública, mesmo que com o sacrifício da própria vida.

REFERÊNCIAS 
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AUTORES:
Maj PM Wanderley TUROLLA Alves Cardoso
Maj PM ORIVAL Santana Júnior
Maj PM DEMÉTRIUS Gomes Lopes
Maj PM Eduardo MOSNA XAVIER

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